Uma análise concisa do que já havia de inovador no jovem Machado de Assis.
Machado de Assis (1839-1908) conquistou e ainda conquista uma legião de leitores. Milhares de pessoas instruem-se, divertem-se e se assombram com os escritos magistrais e imortais deixados por esse escritor brasileiro. Sua obra alia-se à sutileza psicológica sem deixar de lado o ambiente político, cultural e social do Rio de Janeiro na virada do século.
No que diz respeito às rupturas literárias, Machado de Assis não se submete a certas estéticas. Rompeu com a estética romântica e, também, a realista, que, entre tantas coisas, louvava o distanciamento e objetividade do narrador, o que resulta em descrições exatas e reais. O escritor refutava o realismo, e dizia ainda que a escola literária se aproximava da reprodução fotográfica, cheia de coisas mínimas e ignóbeis.
Embora seu primeiro romance, Ressureição (1872), não receba, hoje, muitas críticas e atenção do público leitor, este romance já recusa certas características realistas, no eixo temático e no acabamento formal. O romance se configura como um novo projeto literário, já no prólogo Machado adverte que não quis fazer um romance de costumes, mas que tentou esboçar uma determinada situação e seus contrastes.
Em Ressureição, o personagem Félix, um homem de 36 anos, médico que enriqueceu após uma herança inesperada, que nunca havia se encantado por muito tempo por uma moça, ao conhecer Lívia, uma viúva de 24 anos, apaixona-se, e é correspondido. Em função de uma série de acontecimentos, Felix rompe e reata o relacionamento com Lívia inúmeras vezes. Além de disso, um amigo de Félix, Meneses, apaixona-se por Lívia, enquanto Raquel, amiga de Lívia, apaixona-se por Félix. Eis, então, um quadro que poderia gerar o ápice de uma obra romântica, mas nada disso, pois nada acontece entre Lívia e Meneses e nem entre Félix e Raquel. As idas e vindas do romance acontecem em função de Félix, sua psicologia e suas considerações subjetivas, a intensidade só aumenta quando as Lívia e Raquel descobrem que amam o mesmo homem e, depois, com a chegada de uma carta anônima.
O foco do romance está nas motivações dos personagens e suas análises e na posição do narrador, há um espaço reservado para o leitor dentro do romance. Machado prima por outro tipo de leitura, não romântica, não realista, não naturalista ou positivista. Não que ele deixe de lado o Brasil (era comum nos romances do romantismo a exaltação ao amor a pátria, natureza, povo, religião e passado), mas ele alimenta outra forma de expressão, menos ufanista e mais social. O escritor privilegia o confronto de caracteres, faz com que os personagens sejam mais importantes que sequência de ações (como os elementos clássicos das narrativas/tragédias greco-romanas: pathos, peripécias, catarses, entre outros) e deixa de lado as narrativas repletas de costumes regionais e os êxtases poéticos.
Machado de Assis foi um mestre em manter uma ponte entre narrador e leitor, superou as expectativas daqueles leitores acostumados com as características centrais do Romantismo. O narrador de Machado dialoga com o leitor, com um tom respeitoso, porém totalmente irônico, e isso é fortemente marcado em sua obra Memórias póstumas de Brás Cubas.
Inicialmente, a obra foi desenvolvida como folhetim, de março a dezembro de 1880, na Revista Brasileira. No ano seguinte, foi publicada como livro, pela Tipografia Nacional. É importante ressaltar que, nessa época, o romance precisava se adaptar aos novos tempos, não cabia mais mulheres como Lívia, deRessureição, uma obra que transitava em um casamento anulado, ciúmes doentios, brigas entre namorado terminando sozinha.
O defunto-narrador-personagem, Brás Cubas, cava um fosso entre dois mundos, uma revolução ideológica e também formal. Aprofundou o desprezo às idealizações do romantismo e feriu o mito do narrador onisciente, que tudo sabe e julga, deixou transparecer a consciência do indivíduo.
http://homoliteratus.com/ruptura-no-sistema-literario-feita-por-machado-de-assis/
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