terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

As vantagens e desvantagens de ler uma tradução


A leitura de bons livros é altamente positiva para diversos âmbitos da vida intelectual: ampliamos nossas habilidades da leitura e escrita através de materiais de qualidade. Sendo uma tradução, isto pode impactar negativamente em detrimento à leitura de bons autores nacionais?

enhanced-buzz-3967-1366045528-20Antes de tudo, gostaria de agradecer ao leitor Bruno por ter posto a pergunta.
A questão pode parecer problemática inicialmente. Temos, porém, de dividir a questão da seguinte forma: o que é uma boa tradução? O que leva a uma boa tradução? Quais as perdas e os ganhos que se tem com a tradução? Vamos por partes.
A boa tradução seria aquela em que se perde o mínimo possível frente ao original (deixo claro desde aqui, é impossível não perder algo da fonte, mas falaremos sobre o assunto adiante). Lembre-se de que fazer uma tradução é criar um novo texto, pois se transporta uma estrutura de uma língua para outra. As implicações para esse deslocamento são muitas: transfere-se o texto de um contexto cultural para o outro; perdem-se jogadas lingüísticas feitas pelo autor que nem sempre são possíveis de serem adaptadas ao novo idioma (alguém já pensou em como adaptar a expressão bater as botas para outro língua sem parecer ridículo?). Há outras questões que também seguem, mas estas duas são as principais. Logo, sabendo que devemos perder algo no meio do caminho, chegamos ao dilema: o que perder? Aqui separamos as boas traduções das más. Uma boa tradução é aquela em que temos a impressão de que o livro está fluente, sem sentirmos os deslizes de uma tradução duvidosa ou problemática. O que foi sacrificado do texto é algo mínimo, não alterando o produto final, a tradução. Sobre as perdas e ganhos que levam a boa tradução, podemos abrir um grande leque de possibilidades. No entanto, podemos colocar de forma sucinta que a boa tradução é aquela que elimina os pequenos detalhes do texto, os que elevam ainda mais a sua qualidade. Essas perdas ocorrem quando as estruturas do idioma-fonte não têm aporte no idioma da tradução. Pensem, por exemplo, no problema que traz a palavra saudade para o tradutor de português em outros idiomas. Não há correspondência em nenhuma outra língua no mundo, sendo possível apenas que se utilize aproximações do tipo miss you ou manquer, em inglês e francês respectivamente. Essas estruturas, porém, não captam a completude da ideia de saudade, logo levam o tradutor a escolher a perda que se dará ao traduzir – para esse exemplo, existem várias possibilidades que também podem ser utilizadas, todas levando a perde de algo na tradução.
Agora podemos pensar: será que uma tradução pode impactar negativamente em detrimento à leitura de bons autores nacionais?
Pode ter um impacto negativo quando a tradução for ruim em vários níveis – tornando a leitura tortuosa, enchendo o texto com centenas de notas de rodapé desnecessárias, fazendo com que não seja claro como ele deveria ser etc. Esses problemas vêm de uma tradução problemática ou de um tradutor sem conhecimento técnico suficiente para transpor um texto de uma língua à outra. Posso dizer, felizmente, que no Brasil temos um grande número de tradutores competentes nos mais variados idiomas, do inglês ao francês, passando pelo russo, sueco, japonês, húngaro e muitos outros. Com estes, a leitura de uma tradução tende a ser tão boa quanto a do título nacional, dependendo apenas na qualidade do texto em si como produto criado por uma pessoa – e isso vai além do trabalho do tradutor.
Assim, chegamos ao ponto importante da questão posta: ler um livro traduzido ou um nacional dependerá muito mais das tuas necessidades, anseios e gostos pessoais do que realmente da tradução. A necessidade e o gosto pessoal que guiarão tuas escolhas, levando-te a ler textos nacionais quando preciso, bem como os estrangeiros. Não se perde nada em ler uma tradução quando ela é bem feita. Não se deve fechar portas nem a um nem ao outro. Deve-se, isso sim, repensar a leitura de um livro traduzido quando se vê que a fluência do texto é problemática pelos motivos supracitados. Nesse caso, podemos buscar outras traduções do mesmo livro até encontrarmos aquela que transmitirá o prazer da leitura que estamos procurando.
Enfim, lembre-se: o que torna um livro bom ou ruim não é a tradução, mas o conteúdo.
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